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“Comunicação em Debate” traz Leonardo Sakamoto a Unisinos
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Foi pensando em transformar “limão em limonada”, que o jornalista e doutor em Ciências Políticas Leonardo Sakamoto juntou todas as lições que aprendeu com os boatos e xingamentos que recebia na internet e escreveu um livro, que mais se encaixa em “um manual de sobrevivência na internet”, como ele mesmo o descreveu. “O que aprendi sendo xingado na internet”, além de ser o nome da obra, foi o tema da palestra do professor, no Anfiteatro Pe Werner, na noite de quinta-feira, 14 de setembro.

Entre cases e brincadeiras sobre sua figura na internet, Sakamoto falou de conceitos políticos como alguém que bate um papo no café da manhã. Algoritmos da internet e conceitos de políticas públicas foram explicados para os estudantes, que lotaram uma plateia de 700 lugares, de um modo prático e de fácil entendimento. A atenção do público ficou presa às palavras do jornalista por mais de uma hora.

Logo no início do encontro, avisou que não poderia palestrar no Rio Grande do Sul sem falar do episódio envolvendo o fechamento da amostra “Queermuseu”, no último domingo, 10 de setembro. Sakamoto leu um texto que escreveu sobre o ocorrido, onde afirmava que “A saída para contrapor tudo isso (intolerância) não é o silêncio, mas outras vozes, ampliar o debate público de qualidade em qualquer lugar para tentar evitar o inevitável”.

“Debate público” foi a ideia e a solução apresentada pelo palestrante durante sua fala. Depois, Sakamoto participou de um rápido debate com os professores Daniel Bittencourt, dos cursos de Jornalismo e Comunicação Digital, Clóvis Gedrat, de Licenciatura em Filosofia, e Guilherme de Azevedo, do Direito. O público presente e as pessoas que acompanharam a transmissão ao vivo, pela página da Agexcom, puderam enviar perguntas através do evento no Facebook.

Foto: Sofia Wilhelms Wolff

Das lições aprendidas na internet

A primeira lição trazida por Sakamoto, “A parte invisível da rede já é um relevante formador de opinião no Brasil”, foi tirada a partir de um boato que circulou na internet, vindo de um anúncio pago, linkado com seu nome. A palavra “invisível” significa todo aquele conteúdo compartilhado, sem nome e sem assinatura. Aquilo que ninguém sabe quem escreveu ou as fontes das informações, mas que são compartilhados por responder a um único critério: as pessoas querem acreditar naquela informação.

“O ponto é que, pela primeira vez, a quantidade de conteúdo  que circula, entre as pessoas, sem fonte de informação e sem credibilidade, de forma espontânea ou orientada, é muito grande, e isso realmente está fazendo diferença na formação de sentido nas pessoas”, explicou o professor. Com uma estrutura parecida com a de uma notícia de veículos tradicionais, com título, linha de apoio, lide, um assunto de interesse de um grupo e fragmentos de realidade, faz com que as pessoas acreditem que aquela informação é verdadeira.

“Para muitos leitores não faz diferença se a informação é verdadeira ou falsa”, foi o segundo ponto trazido para a reflexão. Para o professor, muitos leitores acreditam que algo é verdade quando compactuam com aquela informação, e mentira é tudo aquilo com a qual eles discordam. “Neste sentido, quando chega uma informação na timeline do leitor, ao invés de olhar, pensar e pesquisar, se ele concordou com aquilo, ele pensa ‘é verdade’ e se é verdade, ‘eu vou compartilhar com os amigos’. A pessoa não quer imaginar que uma informação contrária ao que ela acredita possa ser verdade, porque isso mexe profundamente naquela ideia inabalada de que ‘eu posso errar’”, exemplificou Sakamoto.    

A classificação dada pelo professor ao fato de os internautas não checarem as informações foi “tragédia”, pois segundo ele, as pessoas utilizam as redes sociais para reforçar aquilo que elas acreditam e não necessariamente aquilo que realmente acontece, assim, é impossível construir significados conjuntos. “O esforço de reportagem é jogado no lixo, as vezes por conta de um meme. A pessoa passa meses produzindo um conteúdo muito bom que é capaz de subverter a forma como a gente vê determinado conhecimento e o que acontece? Vem um sujeito e faz memes, deslegitimando aquele conteúdo”, indignou-se.

 

Foto: Sofia Wilhelms Wolff

“Se o debate público fosse mais qualificado, as pessoas se sentiriam motivadas a se informar melhor”, e “a escola tem um papel central para o futuro dos debates nas redes sociais” são a terceira e quarta lições apresentadas no evento. Para o professor, a população brasileira não foi “ensinada para o debate público” e então, as pessoas são inclinadas a, ao invés de promover o debate, restringir o acesso das outras pessoas àquilo que não concordam.

“Às vezes a gente prefere o lugar confortável do silêncio diante das aberrações que passam na nossa frente nas redes sociais, ou então àquela frase ‘mas não adianta’, e isso não é verdade”, explicou. O professor fundamentou a sua pontuação em um estudo realizado pela universidade da Catalunha que diz que quando você responde um comentário negativo, questionando-o logo no começo, o discurso que se segue é transformado. “Sim, interferência funciona”, garantiu o palestrante.

Para Sakamoto, o combate à intolerância só é possível através da qualificação do debate público e que isto é possível trazendo a discussão para dentro de instituições como igrejas, escolas, universidade e a própria mídia, que são as responsáveis por passar adiante as narrativas da sociedade. O problema visto pelo jornalista é que isto demanda políticas públicas e interferência no estado.

“Como você consegue qualificar a mídia, a informação em um momento em que existem grupo tentando fechar exposições de arte?” questionou. O jornalista lembrou que na Alemanha Nazista, livros com ideias contrárias às que permeavam o poder foram queimados em praça pública, restringindo o acesso àquela informação contida nas obras, ao invés de promover o debate sobre as ideias.

Foto: Sofia Wilhelms Wolff

Dentro de todas as instituições existentes, Sakamoto diz que a escola é a que tem o papel fundamental no futuro dos debates nas redes sociais. Para que isto seja possível, pontuou três pontos indispensáveis no processo: educação para a mídia; educação para a diferença; e educação para o debate público. Em 2013, quando muitos jovens foram para as ruas reivindicar direitos e contra a corrupção, o problema observado pelo professor foi o fato de que não houve uma discussão, onde todos os grupo ocuparam o espaço público mas não conseguiram debater.

Por fim, “falta amor no mundo, mas falta interpretação de texto”, foi o último ponto abordado pelo professor. Para ele, não falta apenas o debate público ou a empatia, mas também a paciência para com o outro. “Quantas vezes você já respondeu de forma agressiva sem dar a perspectiva para a outra pessoa poder responder ou se justificar? Quantas vezes você conseguiu parar para tentar absorver o que o outro quis dizer mas não conseguiu com as palavras?

Cada pessoa é personagem essencial para a tolerância

Falando para uma plateia formada majoritariamente por estudantes de Comunicação, disse que a tolerância começa com um ato individual de entender que a gente não sabe de tudo, que existe um processo de contínua construção. Sem saídas mágicas, jogou a responsabilidade do futuro deste debate para os presentes. “Vocês são capazes de fazer a revolução que a gente precisa, utilizando as ferramentas digitais que a minha geração ajudou a criar mas que não foi capaz de executar”.

Foto: Sofia Wilhelms Wolff

No debate que se seguiu, Sakamoto bateu, mais uma vez, na tecla do debate público e admitiu aceitar muita coisa em nome do debate. Para ele, o debate público já gerou colocações melhores do que tentar calar o outro e que esta é a beleza da construção de significados. Neste ponto, disse que a comunidade acadêmica deve promover o debate com a sociedade e que para garantir a eficiência, deve fazer isto a partir da linguagem da comunidade.

Sobre o discurso de ódio ser confundido com liberdade de expressão, o professor foi muito rígido quando as diferenças. Para ele, dar uma opinião sobre um fato não significa renegar o outro, o que se configura a liberdade de expressão, porém, quando o discurso coloca em risco a dignidade do outro ou tenta colocar em cheque a existência do próximo, configura a disseminação do ódio.

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