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O fenômeno dos games que viram filmes e séries 
"Filmes e jogos: seria essa uma combinação perigosa ou de sucesso? O debate tem muito a ver com a Indústria Criativa e o Mescla entrou nele"
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Há quem acredite que adaptar jogos para o cinema seja uma prática desnecessária e sem sentido. E há aqueles que defendem essa tendência que existe há anos na indústria do audiovisual.  


Alguns exemplos são muito bem-sucedidos, como a recente série da HBO “The Last of Us” e o filme “POKÉMON – Detetive Pikachu”, enquanto outros são um completo fracasso, como o filme “Super Mario Bros.” – a obra de 1993, não a que está para estrear agora em 2023.  


Falando mais sobre “The Last of Us”, ela é a terceira maior série adaptada dos games em popularidade entre os fãs, segundo o site JustWatch, plataforma que cataloga obras audiovisuais no streaming e possui mais de 30 milhões de usuários. A produção é uma das mais citadas atualmente como um bom exemplo de adaptação do mundo dos jogos para o audiovisual.


Para entender melhor esse fenômeno, o Mescla conversou com a cineasta Lisiane Cohen, professora do Curso de Realização Audiovisual (CRAV) da Unisinos, e com dois alunos da graduação.


A opinião dos fãs 


Pedro Rimoli é aluno do 5º semestre do CRAV e aficionado pelo jogo e pela série. Para o estudante, a experiência de jogar e a de assistir são completamente diferentes. A interatividade do game facilita a conexão com os personagens da história. “Por isso, para uma boa adaptação, é muito importante ser fiel à essência do jogo, mesmo sabendo que são criados novos conceitos e elementos a partir da referência que já existe”, avalia.



Pedro diz que é muito importante para uma boa adaptação ser fiel à essência do jogo (Imagem: arquivo pessoal) 



Leonel Dadalt, colega de curso de Pedro, e que está também no 5º semestre, entende que se criou uma reputação ruim (dos filmes que são adaptados de jogos). “Isso porque, antigamente, nos anos 1990, teve bastante adaptação ‘tosca’, que era feita unicamente para juntar dinheiro rápido”, comenta o estudante. Ele cita como exemplos “Street Fighter”, os filmes da franquia “Mortal Kombat” e, mais recentemente, “Warcraft – O Encontro de Dois Mundos”. Mas Leonel é bastante otimista e vê com bons olhos o avanço dessas produções. “Com o passar do tempo, nós vamos vendo cada vez mais adaptações boas”.



Na opinião de Leonel, a reputação ruim dos filmes adaptados de jogos surgiu nos anos 1990, quando foram produzidas obras ‘toscas’ unicamente para juntar dinheiro rápido (Imagem: arquivo pessoal)



Pedro e Leonel pensam igual com relação a como as adaptações de jogos para o audiovisual devem ser desenvolvidos. Para eles, não é preciso que os filmes sejam super fieis à história dos games. Mas uma boa adaptação deve trazer a identidade daquele jogo para a tela, cuidando especialmente dos personagens, das interações e dos cenários. Filmes como “Terror em Silent Hill”, na opinião da dupla de alunos, fazem isso com maestria. 


A contrapartida 


Lisiane Cohen, que ministra disciplinas de roteiro e dá aulas para diversos cursos da Escola da Indústria Criativa (EIC) da Unisinos, lembra que um filme é um produto, principalmente no mainstream. “E os patrocinadores visam o lucro desse produto, o que significa que eles não estão, necessariamente, muito preocupados com o conteúdo das obras”, observa a professora.



Lisiane Cohen lembra que um filme é um produto que visa o lucro (Imagem: arquivo pessoal) 



“Mais tempo de filme significa menos exibições por dia numa sala de cinema, o que quer dizer menos dinheiro para os produtores”, explica Lisiane. Segundo ela, fazem parte da realidade desse meio os cortes e o limite de tempo. “Por serem mercadorias com objetivos diferentes, essas obras (filme e jogos) não devem ser comparadas”, destaca a professora.  


Sonic: O Filme” é citado pela cineasta como um exemplo negativo de adaptação. Na opinião dela, além do filme ser ruim, ele não possibilita que o público se relacione com o personagem como se relaciona no game. “O que leva as pessoas a jogarem o Sonic é o Sonic. Não é a história”, pontua. Em casos como o desse jogo, que não possui uma narrativa linear, com acontecimentos que compõem uma história propriamente dita, Lisiane sugere que se deve trabalhar em cima dos personagens que já existem.



Sonic em versão para o cinema (direita) e jogo: “Sonic: O Filme” é um exemplo ruim, que não possibilita que o público se relacione com o personagem como se relaciona no jogo, segundo Lisiane Cohen (Imagens: divulgação) 



Para ela, incluir o desenvolvimento de personagens no roteiro é uma das chaves para se ter uma boa história, seja ela uma adaptação ou não, e a escassez de tempo do cinema dificulta esse processo. A maioria dos games dispõe ao público horas de experiência, o que facilita esse desenvolvimento. Essa é uma vantagem dos jogos.    


Leonel ainda aponta para o sentimento de saudosismo que existe entre os jogadores. “O investimento que você coloca em um jogo é diferente. Há um investimento pessoal naquele jogo. Você jogou aquilo e teve a sua história com aquilo, e vê-lo ser transformado em uma outra mídia é sempre algo complicado”, diz o estudante.  


Ele relembra também o caso de “Sonic: O Filme”, que teve o visual do personagem principal completamente alterado após críticas de fãs ao primeiro trailer do filme, que apresentava uma versão mais realista do ouriço tão querido pelo público. “A internet caiu em cima, pedindo por um visual que lembrasse mais o clássico dos jogos. E os pedidos foram ouvidos”, comemora Leonel. 


As discussões são muitas. Mas o que não se pode negar é que a prática de adaptar jogos para filmes ou séries não vai ser abandonada pela indústria tão cedo, já que essa é uma forma de expandir o público e celebrar obras aclamadas. Lisiane acredita que qualquer história pode ser contada em qualquer mídia. “Mas devemos sempre ter em mente que existem as limitações e características únicas que cada meio oferece”, alerta a cineasta.  

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