(Texto: Eduarda Bitencourt e Luiza Soares)
Contar histórias de viagem é algo que faz parte da história da humanidade. Desde Homero, que narrou a trajetória de Ulisses em Ilíada até os stories do Instagram, todos continuam compartilhando as descobertas e estranhamentos que são causados por estar em um novo local. Se o modo de viajar e contar histórias mudou, o fato de que “todo viajante é um narrador” permanece inalterado.
Foi pensando em compartilhar histórias que um time de viajantes se reuniu para a terceira atividade da semana do Comunicação em Debate, que ocorreu no campus Unisinos Porto Alegre na última quarta-feira, dia 9/5. Mediados pela professora e viajante, Anelise Zanoni, os integrantes da mesa mostraram que viajar é bem mais do que se deslocar.
Jornalista do caderno Viagem do jornal Estadão, Adriana Moreira contou que sempre teve o desejo de se tornar uma repórter de aventura. Em 1996 ela ingressou no jornal como estagiária, mas somente em 2004 começou a narrar viagens e montou uma reportagem sobre turismo de aventura. O foco da apresentação na mesa era a mudança na linguagem ao longo dos anos do jornalismo de viagem. A jornalista deu destaque à ferramenta de “Stories” do Instagram, em que é possível unir informação de qualidade e diversão em formato de vídeo.
Ao relembrar a linguagem do jornalismo durante a sua história, ela contou que em 2009 a internet não era prioridade para o jornal impresso e que uma matéria de viagem não podia incluir o repórter na cena a ser escrita. Adriana relatou que em uma de suas primeiras experiências como repórter de aventura em 2004, ao fazer uma matéria em Socorro, no interior de São Paulo, não pôde mostrar seu rosto na fotografia que ilustrava a matéria e nem se incluir no texto, tendo que escrever as experiências na terceira pessoa do plural. Hoje, o modo de escrever sobre viagens mudou e existe mais liberdade na hora de narrar histórias. O repórter pode se colocar efetivamente na matéria e contar fatos que o marcaram.
“Muita coisa mudou na maneira de transmitir notícia, falar sobre viagem. No meu início de carreira não se falava sobre viagem, nem em outras editorias. E só comecei a falar de viagem em 2004 para trabalhar como repórter em publicações que eu sempre tinha sonhado em trabalhar, como no caderno de viagem. Quando eu cheguei, a ideia era fazer matérias sobre turismo de aventura, que era uma aposta de atrair público jovem na época”, explica.
Inovação e mudanças nas novas narrativas
Fernanda Pandolfi utiliza o modo mais pessoal para narrar viagens, e foi através delas que conseguiu mudar de vida. Incomodada com o rumo que estava tomando dentro do jornalismo, ela percebeu em seu Instagram pessoal a oportunidade de mudar. Assim, em 2016, surgiu a plataforma de viagens Ida e Volta. “Eu sabia que o site deveria ter alma, essência”, explica ela sobre o início da plataforma que era uma extensão do que ela via que funcionava em seu Instagram.
Mudanças e adaptações foram necessárias com o passar do tempo. Fernanda recordou de como alguns padrões de seguidores foram sendo identificados. “Um post com texto e história sempre gerava mais engajamento do que um com apenas a foto. Assim eu percebi que o que eu tinha para oferecer era a palavra”, conta. A palavra criou aproximação e ligação emocional com leitores e, assim, naturalmente, as marcas se aproximaram. A jornalista reforça que é necessário manter o texto e o jornalismo em primeiro lugar e quando houver a ligação com algum produto ou marca, ela deve ser orgânica e natural. Nessa trajetória de conexões, a inovação é imprescindível e através dela se consegue crescer.
A inovação é também o princípio que rege o trabalho do professor e fotógrafo Bruno Alencastro. Por ter passado por 14 países, ele montou sua apresentação baseadas em catorze dicas para criar uma narrativa visual. Alguns pontos mais discutidos na fala de Bruno foram a questão da reprodutibilidade de fotografias e o porquê de fazer uma foto. Para ele, também é necessário haver inovação na construção de uma narrativa visual, o quanto mudou o discurso visual e ainda o que podemos inovar, para isso é preciso ter diferentes visões do mundo. Pesquisar a luz, horários de atrações turísticas ajudam a construir uma narrativa diferente, assim como elementos humanos no cenário da fotografia, além também de estar atento aos eventos que estarão ocorrendo na cidade.
Experiências que transformam
Diretor de marketing da loja Império Persa Home Design, Pedro Zaman estava acostumado a conviver com objetos que não eram nativos do Brasil, mas foi só com uma viagem para a Índia que ele vivenciou a história por trás das coisas que o cercavam. Intitulada de “Caminho das Índias”, a viagem incluía Pedro e dois arquitetos que buscavam entender o local através de sua história, cultura, produção e arquitetura.
Marcados pela religiosidade, o extremo contraste entre luxo e pobreza e a rusticidade do local, eles puderam ver de perto todo o processo de produção e dos itens que fazem parte do dia a dia. Pedro afirmou que a experiência trouxe um olhar diferente à rotina dele. “A minha vida está dividida entre antes e depois da viagem à Índia”, resume.
Silvia Dálmas também teve a vida alterada por uma experiência no exterior. Buscando viajar com pouco dinheiro, ela encontrou no intercâmbio voluntário a oportunidade de conhecer novas culturas enquanto trabalhava com algo que acredita. A Escola Aldea Yanapay foi criada por Yuri Valencia e está localizada no centro de Cusco, no Vale Sagrado. Lá, a educação das crianças é baseada no amor e na empatia e visa a colaboração invés da competição.
Silvia ressaltou que o intercâmbio voluntário não faz do voluntariado um herói, se trata também de uma visão diferente de um local, não aquilo que estamos acostumados a ver em diferentes histórias de viagem. “A experiência que transforma não se dá pelos pontos turísticos”, afirma Silvia ao relembrar de sua viagem. Hoje, a certeza dela é que “Jornalismo e trabalho social com crianças são minhas paixões”. No final da noite após a troca de histórias, a plateia saiu com a certeza que uma viagem pode ser narrada de várias formas e que cada experiência é única.