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Spotlight revelou o papel social do jornalismo investigativo
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Premiado com o Oscar de melhor filme, em 2016, “Spotlight – Segredos Revelados” retrata o dia-a-dia do núcleo de repórteres investigativos do jornal The Boston Globe, nos EUA. Baseado em uma história real, a produção mostra o trabalho árduo dos jornalistas para denunciar um esquema de abuso sexual praticado por sacerdotes da igreja católica contra crianças e encoberto pela entidade durante anos. As primeiras reportagens foram publicadas em 2002 e, depois disso, cada vez mais denúncias semelhantes foram aparecendo no mundo todo, inclusive no Brasil.

Um filme sem grandes efeitos visuais e sonoros, mas que pela simplicidade e história comovente, conquistou o público e também as críticas. A narrativa deixa claro o importante papel social que jornalismo investigativo tem. Na produção, a equipe formada por quatro repórteres e um editor investiga acusações de pedofilia feitas contra padres. Inicialmente, trabalhava-se com a hipótese de que cerca de 70 religiosos estavam envolvidos no esquema. Com o decorrer da apuração, logo o número aumentou muito, provocando uma crise na igreja católica.

O trabalho de coleta de dados da equipe também chama muito a atenção. Durante meses os profissionais analisaram documentos, correram atrás de fontes que confirmassem as suspeitas, encurralaram sacerdotes e representantes da igreja católica, ouviram as vítimas. Tudo de maneira analógica, sem muito auxílio de computadores e grandes tecnologias. Vale ressaltar que a investigação feita pelo núcleo do The Boston Globe demandou tempo e investimento financeiro por parte do jornal, algo que não é tão comum dentro das redações.

Muitos estudantes de Jornalismo e o público em geral, manifestaram nas redes sociais o desejo de que mais reportagens desta linha ganhem espaço dentro dos veículos de comunicação. Outros acreditam que a imprensa brasileira deve se inspirar no trabalho da equipe americana, utilizando o jornalismo investigativo em prol da sociedade, criando núcleos semelhantes com o do filme dentro veículos. O problema, porém, não é a falta de profissionais que trabalhem com jornalismo investigativo, mas todo o grande investimento que ele demanda das redações.

“Não consigo afirmar se a produção do filme é fiel à realidade que se propôs a mostrar, por não tê-la vivido. Mas é próxima à rotina de uma apuração de fôlego que envolve a coleta, organização e “entrevista” de dados e documentos, a busca por fontes humanas que confirmem ou refutem a história e os debates internos a respeito do material obtido. O que pode escapar ao espectador é que as redações não são assim o tempo todo, não é todo dia (nem mesmo toda semana) que se tem uma equipe dedicando-se exclusivamente a um tema, debatendo sobre ele”, comenta a jornalista Marina Iemini Atoji, gerente-executiva da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Marina acredita que um conjunto de situações contribui para a eventual redução da quantidade de reportagens investigativas, mas que a principal é o enxugamento das redações, que leva profissionais a terem de produzir mais de uma pauta por vez, restando pouco tempo para apurações que exijam dias ou meses de imersão. Outro problema é o grande investimento financeiro que este tipo de trabalho demanda, o que não é fácil bancar em tempos de crise. Por isso que ainda é das redações de jornais impressos e veículos tradicionais que saem mais reportagens investigativas.

Segundo Leandro Demori, representante do Medium no Brasil, esta realidade está mudando aos poucos,. Cada vez mais a plataforma vem sendo utilizada por jornalistas, muitos independentes, para a divulgação de reportagens investigativas. “O perfil do site acaba chamando esse tipo de reportagem. O Medium não dá nenhum apoio financeiro, mas impulsionamos as publicações que julgamos importantes e de grande relevância. Acredito que é por isso que cada vez mais jornalistas então se juntando à plataforma”, disse Demori.

Leandro conta ainda que é membro da Abraji e que divulga junto aos profissionais o espaço do Medium, que é gratuito e pensado para jornalistas. “Como jornalista, eu entendo que o nosso trabalho é dar luz a coisas que estão na escuridão. Nós damos voz aos problemas, pegamos temas que normalmente não são trabalhados e buscamos enxergar por outro ângulo. Acredito que a função social está em todas as linhas do jornalismo, não apenas no investigativo”, conclui Demori.

Alternativas para o jornalismo investigativo

A Abraji atua no aperfeiçoamento profissional de jornalistas e estudantes de Jornalismo, por meio de cursos e de um congresso anual. A ideia é que jornalistas mais bem preparados produzam um jornalismo de qualidade e responsável. O evento também traz o próprio jornalismo para debate e reflexão, além de temas que não estão diretamente ligados ao exercício profissional, mas o afetam significativamente, como o empreendedorismo, novas mídias e questões jurídicas.

“Dois outros campos de atuação da Abraji visam a dar suporte ao jornalismo investigativo: acesso a informações públicas e liberdade de expressão. Ajudamos a aprovar a Lei de Acesso a Informações Públicas e temos feito o monitoramento de sua implementação. Acompanhamos casos de violência contra jornalistas no exercício de sua profissão e damos visibilidade a eles, buscando mitigá-los”, conta Marina Iemini Atoji.

Mariana deixou algumas dicas para quem quer seguir carreira no jornalismo investigativo: “Estar sempre atento ao que ocorre ao seu redor é premissa para qualquer jornalista. A partir disso, questionar tudo e todos (inclusive a si mesmo), no sentido científico (por quê? Para quê? Por quem? Em nome de quem?). Checar tudo mais de uma vez também é fundamental para o profissional de qualquer área no jornalismo. Divulgar ou deixar de divulgar algo tem consequências importantes, e a precisão é valiosa”, disse a jornalista.

Ela garante ainda que é preciso ter persistência e certa resiliência, pois não é uma carreira tranquila. “Também não é emocionante o tempo todo. Em boa parte do trajeto, o ofício trata das histórias ordinárias – mas nem por isso elas são menos importantes. Às vezes, é delas que vêm as grandes histórias investigativas”, conclui Marina.

Uma alternativa para financiamento do jornalismo investigativo, são os programas de bolsas-reportagem. Atualmente, a Agência Pública, veículo independente e conhecido pelos trabalhos de investigação jornalística, está recebendo inscrições de projetos para investigação do Judiciário Brasileiro. A bolsa é de R$2 mil e mais informações sobre os critérios de participação podem ser encontradas em http://apublica.org/2016/01/atencao-reporteres-e-hora-de-investigar-o-judiciario/.

Novidades sobre jornalismo investigativo, informações sobre bolsas de incentivo, esclarecimentos sobre a Lei de acesso à informação e muito mais podem ser acessados no site da Abraji.

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