Existem protagonismos na história do curso de Jornalismo da Unisinos. Um deles, que hoje é pouco conhecido, foi a criação e implementação da Revista Zum Zine. Ela carrega consigo um importante título: foi a primeira revista eletrônica universitária do país.
No Brasil, na segunda metade da década de 90, a internet já dava os primeiros passos rumo à expansão massiva pelo país. Seu uso ainda era restrito e era utilizada para trocas de e-mails e conversas em chats, contudo, isso não impedia que pessoas enxergassem possibilidades nela para a difusão de informação e conteúdo. Anterior a esse processo, antes mesmo dos anos 90, pelo mundo, surgiram as e-zines.
O termo é uma abreviação de electronic magazine (revista eletrônica). Também foi chamada de fanzine (mesmo essa não se prendendo unicamente à web), pois a produção desses periódicos em muito era associada ao indivíduo conhecido como fã. O processo era muito simples: alguém tinha apreço por um tema, criava uma publicação online que abordava o assunto e a divulgava para outros fãs. É dentro dessa definição, porém enraizada no jornalismo, que surgiu a Zum Zine.
A revista, na época, era uma iniciativa inovadora do curso de Jornalismo para a universidade. Não por ter sido a primeira, mas por ser uma das iniciativas que usava a internet como ferramenta para disseminar informação ao aluno-leitor. Os responsáveis pelo periódico não eram fãs nem amadores. Idealizada e comandada por professores da Unisinos, a revista abrigava colunistas e repórteres que, mensalmente, produziam o jornalismo eletrônico.
O projeto, que nunca foi patenteado, surgiu pelos esforços dos professores Beatriz Marocco, Lara Espinosa e Mauro Steigleder, dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Informática, respectivamente. E revista pertencia à Agexjor (Agência Experimental de Jornalismo) – atual Agexcom. A primeira publicação foi lançada em 1997 e contemplava nove editorias: cotidiano; viagens; London connection (internacional); trova; palco e plateia; Zum cine; tecno Zum; Zum sport; dez. As publicações da revista eram mensais, e as edições, temáticas. As pautas eram decididas em conjunto entre editores, designers e repórteres.
“Era um processo muito artesanal. As pessoas estavam aprendendo sobre como fazer. Não tinha velocidade, não tinha som, a imagem não tinha movimento. Era tudo uma transposição do linear (impresso) pro digital”, conta Beatriz.
O nome da revista veio da ideia de movimento, o Zum representando uma onomatopeia de velocidade. O conceito de rapidez era muito buscado pelo periódico. Segundo Beatriz, o tipo de texto trabalhado pelos repórteres escapava do tradicional. Não havia o uso constante do lide comum, mais conhecido pelo uso da fórmula 3Q+COP. O texto tinha dinâmica, os jornalistas se preocupavam com a estética. Para a professora, criar algo diferente era necessário, pois “um projeto novo não pode ser regido por técnicas tradicionais e já conhecidas”.
Professor de Jornalismo da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Gilmar Hermes foi editor da revista a partir de 1998. Para ele, o periódico era uma forma de experimentar o webjornalismo, as novas formas de trabalhar a notícias na internet junto do design. Segundo ele, é função das universidades prestar atenção nas tendências de cada curso. “Uma instituição de ensino tem de projetar suas atividades e seus conhecimentos para o futuro, de forma a preparar os estudantes que deverão ingressar no mercado de trabalho ou serem empreendedores”, afirma.
Os estudantes que por ela passaram
André Luiz Benedetti, 42, Janaína Camara da Silveira, 40, e Rafael Dalla Porta Pavin, 36, são ex-estagiários da revista. André e Janaína trabalharam como repórteres – ou webwriters -, Rafael foi webmaster (organizava a hierarquia das páginas, códigos fontes e todo trabalho de TI do site).
Janaína descreve o ambiente da Zum Zine como maravilhoso e descontraído. Segundo ela, tanto alunos quanto professores aprendiam juntos. “Além das discussões de pauta, estilos de texto, novos formatos de apresentação do conteúdo, havia muita troca cultural. Era a construção de uma nova plataforma que hoje já é tão trivial”, comenta.
Em 1999, a revista ganhou o segundo lugar no prêmio de jornalismo, na modalidade revista online, da 6ª Expocom. Segundo Benedetti, na época, o grupo não acreditava que poderia vencer. Ainda assim, decidiram encaminhar o material para análise. O processo de envio, no entanto, não foi fácil. O grupo chegou atrasado ao correio, o estabelecimento já havia fechado. Por bondade do funcionário presente no dia, a revista foi enviada. “Algumas semanas depois, recebemos a notícia de que estávamos entre os finalistas da Expocom. Mais adiante, anunciaram a Zum Zine como a grande ganhadora. A partir daí, começamos a ver que estávamos produzindo um produto bem mais diferenciado do que imaginávamos”, conta Benedetti.
Esse não foi o único Prêmio recebido pelo periódico. Em uma lista recuperada pela professora Beatriz, Zum Zine faturou 1º lugar na 5ª Expocom, em 1998, na categoria Jornalismo – Melhor Revista Online. No mesmo ano, foi primeira colocada no SET Universitário da PUCRS, na categoria Revista Digital.
Nas lembranças, vivem as experiências
O projeto pioneiro da Unisinos marcou a vida pessoal e profissional dos estudantes que por ela passaram. O trio de estagiários diz sentir saudades da época em que trabalhava na revista. Para Rafael Pavin, conviver com pessoas que estavam fora de sua área de formação trouxe a ele uma nova visão acadêmica e de vida. Para ambos os repórteres, a Zum Zine foi a porta de entrada para o mercado de trabalho.
Janaína foi contratada, na época, para trabalhar no projeto embrião do clicRBS. Benedetti foi chamado pela Zero Hora – trabalhou como redator no segundo caderno. Pavin participou, em 2001, da cobertura da produção do filme “A Paixão de Jacobina”. O webmaster produziu um site específico para o longa-metragem. Na página, eram divulgadas imagens dos bastidores.
“Fazíamos uma revista on-line, mas nenhum de nós tinha acesso à internet em casa, apenas na universidade. E aqui faço uma confidência: era começo de 1998 quando fui selecionado pra ser repórter da Zum Zine. E foi no meu primeiro dia de trabalho na revista que naveguei na internet pela primeira vez na vida”, revela Benedetti, hoje assessor de imprensa da Unimed Nordeste-RS.
Janaína também comenta que a Agência Experimental de Comunicação da Unisinos (Agexcom), que já existia nos últimos anos de Zum Zine, era uma referência dentro do curso de Jornalismo, principalmente por ofertar a possibilidade de criar a notícia na web. “Trabalhar em internet era um misto de desconfiança e aprendizado. Havia ainda um apego grande pelo jornalismo nas mídias tradicionais”, explica a jornalista, atual editora de mídias sociais e repórter da agência de notícias chinesa Xinhua.
Gilmar Hermes ainda relembra que os professores, através da revista, acompanhavam o desenvolvimento tecnológico e criativo do jornalismo. Com a criação da Agexcom e os portais de notícias que dela surgiram, o mais atual sendo o Mescla, a revista Zum Zine foi encerrada. A data específica da finalização da revista é incerta, mas ocorreu em Como bem definiu Beatriz Marocco: “isso aqui é pré-história da internet, cara”.
As publicações
Não é possível acessar o site da revista, que, assim como as publicações, não existem mais. Entretanto, utilizando a ferramenta Wayback Machine, foi possível recuperar partes da memória da Zum Zine e, consequentemente, da história do Jornalismo da Unisinos. Entre o material recuperado está o expediente do periódico. Clicando aqui, é possível conferir um pouco do trabalho pioneiro de professores e alunos na internet.