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TEDxUnisinos marca a volta da presencialidade do evento anual
"O Teatro Unisinos lotou para assistir a 12ª edição do evento que falou sobre Recomeços "
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*Por Laura Santiago, Gabriel Ferri, Marília Port e Paola De Bettio

Com a apresentação de Onília Araújo, que é empreendedora social, contadora e ativista em diversidade sobre raça, gênero e LGBTQIA+ e Lui Nörnberg, que é professor universitário e psicólogo em formação, homem translatinoamericano, como se define, e Investigador da temática “Outras Docências e Outros Sujeitos”. O tradicional TEDxUnisinos retornou à modalidade presencial, o que inspirou o tema desta edição: “Recomeços”, já que estamos vivendo um “começar de novo”. Em razão da pandemia de Covid-19 as edições de 2020 e 2021 ocorreram em formato remoto.  


Ao todo, 13 speakers de diferentes áreas, como educação, especialistas nas temáticas ambientais e sociais, Indústria Criativa, entre outros, que envolveram o público com suas histórias pessoais que mudaram suas perspectivas sobre o mundo. A equipe do Mescla acompanhou essa rodada de palestras que ocorreu na última sexta-feira, 28, e te conta
um pouco mais sobre algumas das histórias que passaram pelo palco.    




Lui (a esquerda) e Onília (a direita) durante uma conversa entre convidados (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Paulo Fochi  

O público do TEDxUnisinos já conhecia Paulo Fochi, mas como mestre de cerimônias do evento em outras edições. Nesta edição ele retorna ao palco como convidado para falar sobre a infância e educação. Paulo é pedagogo, doutor em Educação (USP), membro da Associação Criança (Braga, Portugal), pesquisador colaborador do Programa de Pós-Graduação em Educação, professor e coordenador do Curso de Especialização em Educação Infantil (Unisinos), além disso é também fundador e coordenador do Observatório da Cultura Infantil. 


Com a pergunta inicial “qual é a história do seu começo”, o professor da Unisinos resgata sua própria trajetória no caminho da educação, em especial a infantil, – para relembrar as singularidades das crianças nas quais os adultos muitas vezes ignoram ou menosprezam.  


Paulo ainda falou sobre o chamado “Direito à beleza”, sobretudo em instituições públicas. Isso porque toda e qualquer criança merece ter acesso a um espaço que a acolha, a escute e a compreenda e que ainda assim possa ser um ambiente colorido e agradável.


Seguindo para o encerramento o professor enfatiza que “as crianças concretizam essas constelações que dançam, cantam e fazem chover e temos um compromisso no mundo que vamos deixar para elas”, ou seja, as crianças carregam pureza e precisamos nos preocupar em entendê-las e fazer com que o mundo que as cercam seja um lugar acolhedor. 


Paulo foi o último speaker do primeiro bloco (Foto: Gabriel M. Ferri) 


Isaac Schrarstzhaupt 

Isaac é pesquisador, graduado em Processos Gerenciais, e, atualmente, trabalha de forma voluntária como analista de dados de saúde pública para a Rede Análise, uma rede nacional de pesquisadores em prol da informação. Durante o período mais difícil da pandemia de Covid-19, ele foi uma das vozes brasileiras que mais engajavam no Twitter no contexto da, segundo o estudo feito pelo IBPAD/Science Pulse. 


Isaac trouxe para o palco do TEDxUnisinos a necessidade da comunicação assertiva, em particular relacionada as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA)- como é o seu caso. Diagnosticado já na fase adulta, o palestrante contou quais eram suas principais dificuldades o que faz diariamente para superá-las.   


O speaker fez uma analogia usando a tecnologia para explicar a mente humana. A chamada memória RAM, responsável pelo armazenamento de conteúdo, é finita. Ou seja, quando chega ao seu limite pode fazer com que o dispositivo fique mais lento e demore a responder, assim como ocorre com o cérebro humano. Isaac disse ainda que no seu caso, a comunicação e a interação social são algumas das coisas que podem esgotar essa “memória”. 


Mas então como lidar com essa dificuldade? O pesquisador percebeu que a partir das narrativas do storytelling com dados, ele conseguia traduzir aquilo que era fácil para ele, e difícil para os demais. Além disso, entendeu que algumas características e até exigências do mundo moderno, como análise de dados, gestão de riscos e planejamento “são habilidades desenvolvidas para compensar um mundo ao qual não nos encaixamos ‘naturalmente’”. 


Ao encerrar, Isaac lembrou que para melhorar nossa comunicação devemos começar ouvindo justamente aqueles que têm  dificuldade em se comunicar. 



Franciele Reche 

Fome. Sob essa realidade desumana, sobrevivem mais de 33 milhões de pessoas no Brasil hoje. Este foi o assunto central da palestra proferida por Franciele Reche, mestra em Indústria Criativa, especialista em Ensino e graduada em Gastronomia. Franciele também é ativista e membro do Fórum Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do RS. 


Franciele trouxe dados que caracterizam o Brasil como o país da fome – apesar da imensa quantidade de alimento produzida no país. Em um panorama em que o alimento tão controversamente assume o protagonismo de uma história de desnutrição, ela entende que é urgente entender o caráter político da comida.


Nessa batalha, Franciele ajudou a construir cozinhas e hortas comunitárias em comunidades de inacreditável precariedade. “Não foi uma, nem duas, nem três mulheres com quem conversei que deixavam de comer para alimentar os filhos”, relembra. A ativista em sustentabilidade alimentar combate uma dor que ela própria não sente e nunca sentiu. Mesmo assim, essa luta se transformou em seu propósito de vida.  


A comida traz dignidade, como Franciele diz. É o básico, um direito fundamental, mas mais de 33 milhões de vozes invisibilizadas política e socialmente. Derrotar a insegurança alimentar é um projeto de vida, porque garante a existência a quem o mínimo é negado. Não dá para normalizar, ignorar, conformar. Afinal, “gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”. 


Franciele durante sua fala sobre a fome e trabalhos comunitários. (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Itanajara Almeida 

A empresária Itanajara Almeida deu início a sua fala através de um questionamento profundo sobre o que nós, o público, fazemos para oportunizar o acesso de mulheres negras ao mercado de trabalho.  


Itanajara é diretora da Odabá, Associação de Afroempreendedorismo, conselheira do Conselho de Participação e Desenvolvimento das Comunidades Negras do RS e coordenadora financeira do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana


Tudo começou com o seu salão de beleza, especializado em cabelos crespos e cacheados, que há décadas é referência no RS. Com a baixa procura de clientes negras, ela percebeu a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho enfrentada por essa parcela da sociedade, e passou a refletir sobre as possibilidades de intervir nessa realidade. 

Assim surgiu o Embelezamento Popular, um projeto voluntário e profissionalizante na área da estética. Com todos os obstáculos para a manutenção da rotina de uma ONG, a oportunidade de expor o trabalho na televisão pareceu ser a chance fundamental para arrecadar apoiadores.  


Itanajara oferece uma dura reflexão sobre a importância das grandes empresas apoiarem projetos desse tipo para oportunizar o acesso de mulheres negras ao mercado de trabalho. Foi uma fala pontente que provocou uma sensação de desconforto na platéia, ingrediente importante para manter o público atento e sensibilizado. 



Itanajara apresentando a iniciativa de Embelezamento Popular (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Gisele Tertuliano  

Gisele foi a quarta “speaker” (palestrante) e já de início questionou: “Quem define o que é padrão?”. Gisele Tertuliano é enfermeira e Cientista Social, Doutora em Saúde Coletiva e professora na Unisinos. Ela integra o Grupo para a Promoção da Equidade de Cachoeirinha (RS) e é membro técnico do Grupo de Pesquisa de Interseccionalidades, Equidade e Saúde da Unisinos.  


Gisele é também modelo fotográfica de campanhas comerciais. Alta, negra, de cabelos raspados, é de uma beleza que não passa despercebida. Durante a palestra, contou que cresceu adorando rádio, TV e revistas adolescentes, e que sonhava em ser capa de uma um dia, apesar de ter poucas referências de jovens negras nestes espaços. Até que foi com a mãe a uma escola de formação de modelos, “numa tarde de verão no centro de Porto Alegre”. Lá, ouviu que que “o seu biotipo não era o padrão”. Se decepcionou, mas a “alma de artista” não morreu ali, já que tocava piano e fazia apresentações com um grupo vocal.

Em 2014,ao ver  Lupita Nyong’o, que também tinha cabelos raspados, recebeu o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, por “12 Anos de Escravidão”,  sua relação com o cabelo, e consequentemente, com a autoestima melhorou.


Além disso, ela que chegou vestida em uma espécie de kimono, feito pela marca de uniformes com estampas afros da Alyne Jobim, que estava na plateia, assistindo as falas da Itanajara, “speaker” anterior, e da Gisele emocionada. Aline contou que convidou Gisele pra ser modelo da sua marca e foi ali que descobriu que esse era o sonho da Gisele. “É toda uma vida em busca da autoaceitação, da busca pela identidade”, afirmou Gisele neste momento. 


“Aqui estamos, momento de incerteza, mas com uma certeza: sobrevivemos. Mudança abrupta na rotina e a certeza de que hábitos e atitudes precisam mudar”, assinalou. Em sua fala, ela contou que seguiu a vida através da escolha de cuidar: “Eu escolhi cuidar: cuidar dos outros e cuidar de tantas pessoas, e cuidar, também, para que essas pessoas cuidem de nós” e logo emendou “Cuidado é um exercício de responsabilidade, de ética, de amor, de compaixão e de amor-próprio”.  


Para concluir, lembrou que teve poucas alunas negras no ensino técnico e na graduação, e lembrou de uma em especial, a Tati, que veio do Haiti e sonhava em ser enfermeira. Para ela, essa é uma boa história de Recomeço. Dessa forma, ela encerrou com uma frase da filósofa negra e norte americana Angela Davis: “Quando uma mulher negra se movimenta, toda a sociedade se movimenta com ela”. 



 

Gisele e seu questionamento: “Quem define o que é padrão?” (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Rafael Mello – Sarah Vika 

Rafael é publicitário com mais de uma década de experiência e realizou o TCC sobre a construção de uma persona drag. Ele foi o segundo “speaker”. Ao ser apresentado, os mestres de cerimônia disseram que  ele “alimenta sua criatividade” através da arte drag. A Sarah Vika é a sua personagem há cinco anos, e hoje é o principal ativo da sua carreira. 

Rafael chegou ao palco já com a pergunta: “Se você pudesse ser outra pessoa, quem você seria?”. Ele contou sobre como a escolha profissional somado ao fato de ter se descoberto  LGBTQIA+, o que fez a escolha profissional ser mais difícil, já que sentia poucas opções onde seria acolhido. “O Brasil é o país que mais mata LGBTQIA+, a gente tem muito medo de sofrer inúmeros tipos de violência, e dentro do ambiente acadêmico ou da carreira profissional, isso não é diferente, só vem mais velado”, afirmou. 


Como Rafael sempre foi muito comunicativo, o que, segundo contou, trouxe problemas na época da escola, ele sentiu que a área da Comunicação era um bom caminho. “Mas nessa trajetória de comunicador, enquanto publicitário, em alguns momentos eu sentia que eu não estava comunicando exatamente o que fazia sentido pra mim”, afirmou ao contar que muitas vezes trabalhou para campanhas que iam contra o que ele acreditava e o legado que ele queria deixar.  


“Peças lindas na rua? Bacana, mas isso de fato faz as pessoas refletirem sobre quem a gente é?”, questionou. Em 2012 ele conheceu a série RuPaul’s Drag Race, da Netflix, e para ele foi um recomeço e transformou a sua existência. Foi a série que fez ele se questionar o que ele seria se não fosse o Rafael. “Eu acho que daqui a pouco vocês vão descobrir”, brincou.  



Sarah Vika 

E eis que a última pessoa a subir no palco foi Sarah Vika. “Quando eu descobri que se eu pudesse ser outra pessoa eu seria uma drag queen, foi quando a minha vida recomeçou e finalmente entrei em contato com quem eu era e sou”, afirmou Rafael/ Sarah. A personagem tem 33,8 mil seguidores no Instagram, integra diversas campanhas publicitárias, além de ter participado do “Queen Stars” da HBO Max Brasil e do programa SuperBonita do GNT.  


“Drag queen nada mais é do que uma performance artística de gênero, onde indivíduos, sendo homossexuais ou não, resolvem performar por algumas horas a vivência do outro gênero, muitas vezes de forma exagerada, ou de forma artista ou questionadora”, explicou. Rafael/ Sarah também explicou a origem do termo “drag”. Ele contou que fez seu trabalho de conclusão de curso sobre a criação de uma persona drag. “Porque foi essa arte, com essa liberdade poética do ser drag, que fez eu me tornar quem eu sou hoje. E a liberdade poética do ser drag acontece a partir do momento que a gente monta essa caricatura, a gente cria essa imagem.”  


Dessa forma, é possível encantar os outros, segundo ele, e além disso, transformar de alguma forma, também. “Afinal de contas, quem eu queria ser? Era aquele menino que sempre era muito conversador nas aulas e que recebia bilhetes na agenda? Não, mas ele, com certeza, tinha muito a falar, e foi através dessa arte que ele descobriu que ele podia falar e ser ouvido.”  



Rafael no primeiro momento em que subiu ao palco e sua foto como Rafael e Sarah (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Felipe Menezes 

Quais são suas melhores memórias do futuro? Foi assim que Felipe Menezes abriu a primeira palestra do TEDxUnisinos 2022. Felipe trouxe reflexões e pensamentos sobre os estudos dos futuros e como essa vontade de entender o que vem pela frente o motivou a mergulhar de cabeça no tema. 


Felipe em 28 de outubro de 2012, 10 anos atrás da data do TEDxUnisinos pasava por dificuldades na vida pessoal, em curto intervalo de tempo o pai faleceu, seu carro e celular foram assaltados e a esposa com complicações no parto do segundo filho, tudo isso perto de seu aniversário. No meio disso tudo, uma revista com a manchete A Fábrica do Futuro. “Eu devorei aquela matéria e fiquei encantado com a perspectiva que trazia sobre o futuro super tecnológico e a gente nem tinha certeza sobre isso, eu só sabia que precisava saber mais desse futuro que tá vindo”. 


Além de envolver-se com assuntos como a impressão 3D e a realidade virtual, Felipe descreve a tecnologia como apenas um meio para atingir o objetivo. Nos estudos dos futuros destaca o tema dos tempos pós normais, onde as regras antigas não valem mais, novas regras ainda não foram criadas e nada parece fazer sentido, trazendo essa reflexão para o tempo atual que vivemos. 


Trazendo o conceito de cones de futuros, um pensamento onde tudo pode acontecer, Felipe contextualiza que o futuro não existe, por isso há a pluralidade e a possibilidade de se pensar em mais de uma coisa ao mesmo tempo. A palestra finalizou com um convite à uma reflexão, onde nos imaginamos em 2052, 30 anos no futuro.  


O Mescla já abordou anteriormente o assunto de estudos dos futuros em entrevista com Kim Trieweiler, se quiser saber mais clique aqui. 



Felipe foi o primeiro convidado (Foto: Gabriel M. Ferri) 


João Becker 

Os desafios do recomeço, foi o que João Becker compartilhou com as pessoas presentes no TEDxUnisinos. João tinha 20 anos quando caiu de uma altura de 10 metros, resultando em uma fratura na 9ª vertebra torácica e rompimento completo da medula, além de seis costelas quebradas e o pulmão perfurado, foram 21 dias na UTI em 2018. 


Após o diagnóstico de que não voltaria a andar começaram os pensamentos sobre o desafio que seria a readaptação, tanto fisicamente quanto psicologicamente. “Eu me lembro que eu olhava para uma janela que tinha movimento da cidade e eu ficava refletindo, como é que vai ser a minha vida na cadeira de rodas? Será que eu vou conseguir fazer as coisas mais amei? Será que eu vou ter a autonomia que eu sempre prezei?” 


João conta que os primeiros desafios começaram depois da alta do hospital, a autonomia era limitada e era necessário a ajuda constante de alguém, uma perda na privacidade. Aos poucos João ia readquirindo a independência, através da reabilitação em um hospital especializado em São Paulo, o Lucy Montoro. Ao voltar à Porto Alegre ingressou na fisioterapia, e em alguns esportes. Pouco a pouco a autonomia ia retornando. 


Apesar dos avanços na fisioterapia, o objetivo era voltar a andar, o que estava longe. Após estudos e contato com médicos descobriu um novo tratamento chamado estimulação neural, que consiste na implantação de 15 eletrodos diretamente na coluna e a aplicação de pequenas descargas elétricas para realizar um mapeamento das ligações presentes. Com ajuda de amigos conseguiu o apoio financeiro para ir ao México e fazer a cirurgia, “já na primeira semana eu conseguia mexer as pernas de maneira voluntária, a primeiras vezes três anos. Era inacreditável porque me disseram que era impossível. Eu tava provando para muita gente que nada é impossível.” 


João termina a sua trazendo a informação que, segundo o IBGE, no Brasil cerca de 45 milhões de pessoas têm alguma deficiência, quase 20% da população. “tem todo um processo físico para se adaptar pro mundo e é muito difícil. Precisar se adaptar para chegar lá e quando tu chega, é um problema, porque a gente tem muitas barreiras. Tem a barreira física que é a falta de visibilidade e as barreiras invisíveis que é o preconceito, o capacitismo e a falta de empatia.” No final, joão convida o mundo a se adaptar as pessoas com deficiência, assim tornando o mundo um pouco mais acessível. 



João fez uma retrospectiva da sua vida desde o acidente (Foto: Gabriel M. Ferri) 



Ficou curioso de como foi todo o evento? Clica neste link e aproveite para conferir na íntegra. 



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