Deu certo

#cinema #CRAV #realizaçãoaudiovisual
Entre o mercado e a academia: Daniela Israel é empreendedora criativa e pesquisadora 
"A cineasta egressa do CRAV se consolidou como uma profissional multifacetada no mercado audiovisual"
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Daniela Israel se formou pelo Curso de Realização Audiovisual (CRAV) da Unisinos em 2007. De lá para cá, se consolidou como produtora, diretora, empreendedora e, ainda, mestra, pesquisadora CNPq e doutoranda em processos e manifestações culturais.


Ela é sócia e CEO da Bactéria Filmes, uma companhia de conteúdo original para todas as telas e audiências. Fundada em 2007, a missão da empresa é compartilhar histórias fascinantes com o mundo. No catálogo, filmes e séries ambientados em universos fantásticos, assim como documentários focados em manifestações culturais.  


Daniela em seu escritório
(Foto: arquivo pessoal)


Como professora universitária, foi reconhecida com o Laureate Recognition Program – LATAM (2017), e como produtora, recebeu, no Festival Internacional de Cinema de Gramado, o prêmio de “Melhor Produção Executiva” (2019). Representando o projeto Força Gurias, palestrou no TEDxUFRGS em 2016.


Por duas gestões (2014-2016), representou o setor audiovisual no Conselho Estadual de Cultura do RS (CEC-RS), participando, também, como membro da comissão julgadora de diversos editais do FAC Pro-Cultura RS. Foi membro da diretoria da Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do RS (APTC-RS), a primeira mulher a assumir a presidência do Sindicato da Indústria Audiovisual do RS (SIAVRS), participou da fundação do Fórum Audiovisual Minas Gerais, Espírito Santo e Sul/Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Fames).


Daniela iniciou sua carreira muito cedo, tendo se formado com 19 anos. Segundo ela, sua transição de aluna para profissional foi tranquila, mas que, no começo, teve que assumir posições que não eram as que ela almejava quando estava na faculdade, como assistente de direção, por exemplo. Apesar disso, ela considera que foi um processo relativamente rápido de inclusão no mercado de trabalho, considerando a realidade de muitos trabalhadores da área de realização audiovisual. “Em 5 anos, eu já era minha própria chefe”, destaca.


Autogestão e organização do tempo para gestar a carreira


Para equilibrar a manutenção de todas as posições que mantém na sua vida profissional, ela afirma que a chave é a autogestão, em que organização e priorização de tarefas têm papel fundamental. Definir uma ordem do que é mais urgente, escalonando afazeres e dividindo o tempo, são atividades essenciais para Daniela. “Quinta-feira, por exemplo, eu sou só pesquisadora. Não exerço nenhuma outra função”, comenta.


Como produtora, ela explica que não trabalha com foco na realização do filme em específico, mas sim em um nível mais macro. “Eu trabalho para captar, conceber, desenhar um projeto e conseguir financiamento. Quando os recursos financeiros ficam disponíveis, eu passo o projeto para um produtor, que vai executá-lo. Meu trabalho se ocupa muito da escrita criativa, dos materiais para vendas, da participação em editais”, detalha Daniela. Ela acredita que o doutorado a ajuda a desenvolver a escrita, e que as funções que ela executa se complementam nesse sentido.


“É preciso saber o que você quer para a vida”, observa. Uma das habilidades mais importantes, segundo Daniela, é a perseverança, “por mais que pareça clichê”. “Essa noção de entender o que você faz e ser um profissional o mais múltiplo possível é essencial. Sonhar com um Kikito (prêmio do Festival de Cinema de Gramado) e sonhar com um Oscar dão o mesmo trabalho, então, é melhor sonhar com o que me põe para a frente”.


Ela ainda lembra que o cinema não é um setor convencional, com horas de trabalho diárias bem definidas e carteira assinada, por exemplo. É uma outra lógica de trabalho, que possui vantagens e desvantagens, e sempre é preciso se adaptar às diferentes condições que se apresentam na rotina.


“O que eu acho legal do audiovisual é que cada projeto vai te desafiar em algum sentido. Cada projeto vai te dar a oportunidade de mergulhar em um mundo. Os problemas de um filme não são os mesmos problemas de outro. O maior desafio é dar conta de tarefas que são diferentes por natureza. Quando se assiste um filme, ninguém se dá conta que alguém teve que se preocupar com a comida da equipe, pensar onde a equipe fica à noite…”, esclarece a produtora.


Atualmente, Daniela trabalha em alguns projetos. Ela é a produtora da série “Família Parafina”, uma ficção animada para adultos sobre uma família que administra uma pousada. Paralelo a isso, há também a segunda temporada de “Vida Fluxo”, série documental de cinco episódios, com roteiro da própria Daniela. Como diretora, está atuando nos filmes “O Jardim da Rua 13” e “De Volta ao Jardim da Rua 13”, uma animação e sua continuação, que contam a história da cantiga “O Cravo Brigou com a Rosa”. Além disso, está finalizando outra série de animação, “Histórias Atrás da Porta”, e dirigindo “Modo Orgânico”, um documentário sobre a única cadeia de produção de algodão orgânico no mundo, que fica no Brasil, em cooperação com uma empresa da Bahia.


Dentre as referências, os antigos desenhos japoneses transmitidos pela TV aberta  


“A tecnologia veio para afetar, facilitando os processos de produção. Ela não vai afetar tanto os resultados. O próprio mercado deve aceitar e se adaptar às tecnologias desenvolvidas para as produtoras. O conhecimento técnico, o conhecimento artístico em relação a isso é que muda. A questão, para mim, hoje, é como nós trabalhamos de uma forma integrada com a tecnologia”, debate Daniela.  


As principais influências na carreira de Daniela foram os desenhos japoneses da extinta TV Manchete. “Quando eu fui fazer cinema, eu queria produzir desenhos animados. Me disseram que isso não existia, que eu não poderia fazer isso no Brasil. E, hoje, é exatamente isso o que eu faço”. Ela cita também os animes e todo o movimento de cultura pop e blockbusters. “Como eu faço parte de uma equipe que trabalha com cinema fantástico, na Bactéria Filmes nós temos uma linha voltada para isso, nós somos o grupo dos nerds, não posso negar. A minha pegada é mais no sentido de criar universos inimagináveis”, diz a produtora.  


Para ela, tanto produzir quanto dirigir projetos giram em torno do desejo de contar histórias. “Dirigir exige todo um conceito estético por trás, uma proposta, o que tu queres dizer para o mundo, como tu vais trazer isso para o mundo. Eu trabalho majoritariamente na direção de filmes de animação, porque eu não gosto muito do set de filmagem. A produção já vem de um desejo de localizar certa história para que outras pessoas a contem, dando oportunidade e estrutura para que outras pessoas executem o projeto”. 


O interesse por questões de gênero e a importância do CRAV  


Sobre a trajetória acadêmica, Daniela acredita que o CRAV é um curso voltado “para dentro”, já sendo uma especialização dentro da comunicação. Com o intuito de “abrir” o leque de conhecimentos e expandir os horizontes, ela procurou pós-graduações. Depois de finalizar o mestrado, agora está no processo de obtenção do doutorado.  


A pesquisa de mestrado de Daniela teve como tema o desenho Dragon Ball e as teorias do imaginário, com foco na história mítica do Japão, trabalhando a questão do mito, de narrativas que sustentam paradigmas do funcionamento humano.  


No doutorado, procurou entender os filmes dirigidos por mulheres no Brasil. “Tanto a questão da diversidade quanto a questão racial foram coisas que foram surgindo ao longo do meu trabalho. O meu doutorado vem, então, com esse desejo de tentar entender cientificamente as questões relevantes na minha prática diária. A gente precisa questionar alguns fatos, como o de que se tem, no Rio Grande do Sul, a cada oito filmes dirigidos por homens, um é dirigido por mulheres. E essa mulher ainda é branca, se fosse negra não estaria na lista. Essas coisas, que eu considero como injustiças, são motivos para que a gente lute por um cinema mais plural, mais representativo”, defende. 


A relação com os professores foi o principal fator na caminhada na Unisinos que influenciou na trajetória profissional de Daniela. “O meu primeiro emprego eu consegui através de um professor. O CRAV tem professores que trabalham no mercado, então isso te ‘atalha’ muito, porque, assim, tu já conhece pessoas, já sabe onde bater na porta para pedir ajuda”. Daniela menciona também o fato do curso proporcionar um conhecimento sobre o todo da profissão: “Hoje, eu entendo um pouco de tudo. Eu entendo de produção, de animação, também sei montar, alguns projetos eu roteirizo. O curso traz uma particularidade que é essa vivência em cada uma das ‘pontas’”, elogia a produtora.  

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