A professora no Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da Unisinos Ana Cristina Ostermann considera o seu mais ambicioso sonho oferecer, por meio de análises exaustivas das interações sociais, práticas de conversa que auxiliem a fazer fluir a comunicação humana com menos atrito, melhores experiências para as pessoas, e por que não, para a humanização das relações. Seu foco é trabalhar com profissionais de diversas áreas. “Análise da Conversa” é o tema de seu estudo e o início de sua paixão pela interação humana começou no doutorado.
Para a tese, ela analisou o primeiro contato de mulheres vítimas de violência doméstica de gênero com a Delegacia da Mulher e o Centro Feminista de Intervenção na Violência Contra a Mulher. “Enquanto eu estava presente e gravando essas interações, eu ouvi histórias de vida inimagináveis. Nem as mais complexas e melhor elaboradas obras de literatura descreveriam os detalhes de abuso que ouvi essas mulheres relatarem”, conta a professora. Ainda completa: “mais do que histórias, essas eram as ‘rotinas’ de abuso dessas mulheres. Delas e de seus filhos ou filhas, porque uma mulher abusada não é vítima sozinha, é uma família toda esfacelada”, explica.
Durante o estudo, a pesquisadora se deparou com a falta de acolhimento por parte das profissionais que atuam nessa área. Associou isso a dois motivos. Primeiro: o despreparo. Não lhes era oferecido qualquer tipo de formação sobre como acolher por meio da própria fala. Segundo: várias eram alocadas para trabalhar na Delegacia da Mulher apenas por serem mulheres, tomando-se como pressuposto que acolhimento é um atributo natural do sexo feminino. Com os resultados da pesquisa, Ana Ostermann teve a oportunidade de realizar oficinas práticas de interação para essas profissionais.
Com o seu grupo de pesquisa, ela também estudou a interação entre médicos e familiares que passam por situações de gravidez de risco. “Falar sobre malformações fetais, sobre a previsão de morte imediata pós nascimento, sobre morte intra-uterina demanda competências interacionais bastante especiais, quase sobre-humanas, comenta a doutora.
“Buscamos na vida cotidiana, na vida como ela é, o nosso objeto de estudo”, reflete sobre a pesquisa. “Contudo, nas pesquisas em Análise da Conversa, e, portanto, nas pesquisas que desenvolvo, não somos nós, pesquisadoras, que sugerimos quais seriam essas competências”, fala. Por meio da análise minuciosa dessas interações, gravadas e transcritas, conseguimos identificar quais são as práticas já existentes (naquele mesmo contexto investigado) que se mostram como bem-sucedidas. Ou seja, as sugestões que as pesquisas da Análise da Conversa trazem para as instituições sobre melhores práticas interacionais são as que normalmente já estão sendo usadas (ainda que nem sempre) nessas instituições. O trabalho da/o Analista da Conversa é o de descobrir quais são as práticas que se mostram como ‘dando certo.’ “Se o problema está na interação, então é na própria interação que está a solução”, fala a pesquisadora.
No TEDxUnisinos, Ana falará sobre o que é a Análise da Conversa e como esse tipo de pesquisa nos auxilia a desvendar a interação humana, descobrindo o que somos, ou do que nos fazemos parecer ser, como conseguimos convencer alguém de algo, como conseguimos driblar a resistência de alguém em nos contar algo ou como fazemos para resistir (às vezes de formas extremamente sutis) dar determinada informação que alguém busca, de como abordamos assuntos delicados como uma notícia de morte e, acima de tudo, nas palavras de Ana Ostermann, mostrar “como esse mergulho profundo a detalhes tão ‘micro’ das interações humanas é capaz de revelar o mundo ‘macro’ da vida social, inequalidade, violência, poder, mas também humanização, cuidado e valorização do outro”.