Na madrugada de 28 de junho de 1969, a polícia de Nova York invadiu o Stonewall Inn, bar local frequentado majoritariamente pela comunidade gay local. Naquela noite, diferente das demais batidas policiais frequentes na época, os clientes reagiram, em protesto. Frequentadores dos bares vizinhos juntaram-se ao conflito, que se estendeu por todo o final de semana.
Entoando palavras de ordem como “poder gay” e “sou bixa e me orgulho disso”, o conflito chamou a atenção nacional. Imprensa e políticos passaram a promover então debates sobre a temática e junho ficou conhecido como o mês do orgulho LGBTQ+ – e o dia 28 como o Dia do Orgulho.
Quase 50 anos depois, no mesmo dia, a Unisinos coloriu-se com as cores do arco-íris para receber oficialmente o UniDiversidade – Rede de Estudos e Debates sobre Diversidade LGBTQ+. O grupo surge no contexto acadêmico para promover o diálogo, fomentar pesquisas sobre a temática, abrir espaço para manifestações artísticas, eventos temáticos e produções de conteúdo.
Frente ao colorido da bandeira LGBTQ+, estendida na Claraboia da Biblioteca, o reitor da Unisinos, Pe. Marcelo Fernandes de Aquino, abriu o evento. “Eu peço perdão por todas as experiências de sofrimento, de gozação, de machismo e de intolerância. A vocês, que carregam o fardo da incompreensão e da discriminação, o perdão da comunidade da Unisinos”, disse.
Filipe Roloff, egresso da Unisinos e pilar importante na formação do UniDiversidade, falou, visivelmente emocionado, sobre a importância da criação do grupo e do sentimento de acolhimento que ele traz. “Esse fato histórico e simbólico de a gente estar aqui hoje, eu acredito que é só o começo, um primeiro passo, criando o compromisso com toda essa população que precisa ser ouvida e precisa achar o seu espaço”.
Ponto de partida
No início de 2018, um veículo tradicional de comunicação do Rio Grande do Sul realizou uma entrevista com Roloff, em alusão a sua nomeação como um dos 50 futuros líderes LGBT do mundo, pelo jornal britânico Financial Times. O vídeo foi compartilhado pela universidade em suas redes sociais. A partir do episódio, Roloff provocou a Unisinos a pensar na criação de um grupo que tratasse das questões LGBTQs.
Ele recebeu um convite do reitor para conversar e pensar a questão. Houve, a partir de então, um processo de entendimento da proposta, que passou por diversas reuniões e conversas sobre sua estruturação. Um grupo no Facebook surgiu para demonstrar o interesse de diversos acadêmicos, egressos e comunidade universitária no geral.
Depois de algum tempo, nasceu então o UniDiversidade, que tem como pilares o acolhimento e o compartilhamento de conhecimento. Acolhimento no sentido de estar aberto ao diálogo e debates sobre a temática LGBTQ+. Acolher também no que tange a criação de um ambiente seguro dentro da universidade. Ao almejar o compartilhamento de conhecimento, o grupo visa o fomento da pesquisa acadêmica, pautada pelas temáticas LGBTQ+, de forma multidisciplinar.
Parcerias
O UniDiversidade não trabalhará sozinho. Diversas instâncias da universidade são parceiras da iniciativa e atuarão em conjunto com o grupo no atendimento e acolhimento da comunidade LGBTQ+. Profissionais internalizados no grupo trabalham criando pontes entre o UniDiversidade e a ouvidoria e atendimento da universidade.
O papel destas pessoas é auxiliar os estudantes que chegarem com problemas e dúvidas ao grupo a encaminhar seus problemas a instâncias superiores da Unisinos. “Não somos responsáveis, não somos psicólogos, não somos pessoas que vamos resolver. Nós indicaremos o caminho certo, a forma correta de acontecer”, explicou Roloff.
O NAE, Núcleo de Assistência Estudantil, é mais um destes parceiros. O núcleo trabalha acolhendo e acompanhando a trajetória dos estudantes, em relação a questões sociais, psicológicas e pedagógicas. Suzana Moreira Pacheco, coordenadora do NAE, contou que a parceria com o UniDiversidade funcionará como uma mão dupla.
“Por vezes a gente atende alunos, em sofrimento por não ter um lugar para si, por não se identificar, por não se reconhecer. A relação com o NAE é de parceria, é pensar junto, é poder olhar e ver o que a gente pode avançar”, contou. Suzana falou ainda sobre a possibilidade de o UniDiversidade encaminhar ou sugerir o núcleo para alunos com dificuldades, assim como o NAE sugerir que estudantes procurem o grupo para apoio.
Música, ação e reflexão
Quem passou pela Claraboia da Biblioteca no dia 28 deparou-se com provocações, poemas, fotografias, conversas e muita música. Cauê Rodrigues, aluno do curso de Psicologia da Unisinos, expôs uma série de poemas intitulada “Viadagens Catárticas”. Moacir Lopes, egresso do curso de Fotografia, trouxe seus projetos fotográficos “36” e “Existências”. O egresso do curso de Administração, Vinicius Oliveira de Lima, conduziu uma conversa sobre o movimento de moda sem gênero.
Karla Oliveira, do curso de Jornalismo, trouxe a instalação artística “O que te define? Diálogos sobre as corporalidades e as performances de gênero”. O manequim, trazido por Karla instigou os participantes do evento. Com a provocação para que as pessoas o vestissem pensando na identidade que ele teria, Karla questionou os padrões de gênero impostos na sociedade.
“A ideia era que a gente ocupasse o espaço com questões que estivessem relacionados com o tema LGBT, que estivessem algum tipo de representatividade pra gente, pensando no dia do orgulho. Eu pensei em trazer outros elementos, fora as fotos e poemas, que também levantassem alguns questionamentos”, explicou.
Quem embalou e animou o espaço foi a DJ Angel Mix, egressa do curso de Relações Públicas. Phelipe Caetano, estudante de Engenharia Metalúrgica na UFRGS, militante e ativista LGBTI’s, conduziu mais uma roda de conversa sobre a temática LGBTQ+. Finalizando o Dia do Orgulho e a abertura oficial do UniDiversidade, ocorreu uma sessão comentada do filme “Nós duas descendo a escada, produzido e editado por Milton Prado, professor da Unisinos e coordenador do curso de Realização Audiovisual da universidade.
As letras da sigla LGBTQ+
GLS, LGBTTQ, LGBTI, LGBTQ+ e diversas outras siglas são usadas para referir-se à comunidade LGBT. Algumas delas mais abrangentes, outras mais fechadas, como a GLS, que significa gays, lésbicas e simpatizantes. As mudanças nas nomenclaturas e siglas demonstram a evolução ao referir-se a temática, procurando, de alguma forma, abranger e abraçar a todos.
Baseada no Manual de Comunicação LGBTI+, lançado pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS), em alusão ao Dia Internacional contra a LGBTQfobia, segue uma breve explicação de cada letra que integra, já integrou uma sigla LGBT, ou então é importante para o entendimento:
A= assexual: indivíduo que não sente nenhuma atração sexual, seja pelo sexo/gênero oposto ou pelo sexo/gênero igual;
A= androginia: termo genérico usado para descrever qualquer indivíduo que assuma postura social, especialmente a relacionada à vestimenta, comum a ambos os gêneros;
A= agênero: pessoa que não se identifica ou não se sente pertencente a nenhum gênero;
A= aliado: pessoas que independentemente da orientação sexual ou identidade de gênero, promovem os direitos e a inclusão da comunidade LGBTQ+;
B= bissexual: pessoa que se relaciona afetiva e sexualmente com pessoas de ambos os sexos/gêneros;
C= cis gênero: termo utilizado por alguns para descrever pessoas que não são transgênero (mulheres trans, travestis e homens trans);
G= gay: pessoa do gênero masculino (cis ou trans) que tem desejos, práticas sexuais e/ou relacionamento afetivo-sexual com outras pessoas do gênero masculino;
H= heterossexual: indivíduo atraído amorosa, física e afetivamente por pessoas do sexo/gênero oposto;
H= homossexual: pessoa que se sente atraída sexual, emocional ou afetivamente por pessoas do mesmo sexo/gênero;
I= interssexual: descreve pessoas que nascem com anatomia reprodutiva ou sexual e/ou um padrão de cromossomos que não podem ser classificados como sendo tipicamente masculinos ou femininos;
L= lésbica: mulher que é atraída afetiva e/ou sexualmente por pessoas do mesmo sexo/gênero (cis ou trans);
P= pansexual: pansexualidade é uma orientação sexual, assim como a heterossexualidade ou a homossexualidade. O prefixo “pan” vem do grego e se traduz como “tudo”. Significa que as pessoas pansexuais podem desenvolver atração física, amor e desejo sexual por outras pessoas, independente de sua identidade de gênero ou sexo biológico.
Q= queer: adjetivo utilizado por algumas pessoas, em especial pessoas mais jovens, cuja orientação sexual não é exclusivamente heterossexual. O termo queer também é utilizado por alguns para descrever sua identidade e/ou expressão de gênero. Quando a letra Q aparece ao final da sigla LGBTI+, geralmente significa queer e, às vezes, questioning (questionamento de gêneros);
S= simpatizante: referente a aliado;
T= transgênero: terminologia utilizada para descrever pessoas que transitam entre os gêneros. São pessoas cuja identidade de gênero transcende as definições convencionais de sexualidade;
T= transsexual: pessoa que possui uma identidade de gênero diferente do sexo designado no nascimento. As pessoas transexuais podem ser homens ou mulheres, que procuram se adequar à identidade de gênero. Algumas pessoas trans recorrem a tratamentos médicos, que vão da terapia hormonal à cirurgia de redesignação sexual. São usadas as expressões homem trans e mulher trans;
T= travesti: pessoa que nasceu com determinado sexo, ao qual foi atribuído culturalmente o gênero considerado correspondente pela sociedade, mas que passa a se identificar e construir nela mesma o gênero oposto;
(Referência: Manual de Comunicação LGBTI+)
O Manual de Comunicação LGBTI+ pode ser acessado para maiores informações sobre terminologias.