Uma única questão é suficiente para instigar o pensamento: “o que significa viver em um mundo que já acabou?”. Discorrer sobre o assunto foi o desafio do doutor em Filosofia Moysés Pinto Neto durante palestra no TEDxPorto Alegre, ocorrida quinta-feira, dia 22, na Fundação Iberê Camargo.
Vivemos em um momento de proliferação de imagens que retratam o fim do mundo, segundo Moysés, que é professor na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). Para ele, essas imagens representam o pensamento coletivo de que o nosso modo de viver não pode continuar subsistindo. “Essa sensação de fim de mundo, esse mal-estar, […] provoca uma sensação de desconforto inversamente proporcional à nossa capacidade de imaginar alternativas”, afirma o palestrante.
O século XXI elegeu as crises econômica e política como pautas importantes, porém a crise de imaginação é o foco de Moysés. Na visão do professor, esse tema cria a oportunidade para a origem, especialmente na ficção científica, de vidas futuras, representações do mundo com variações significativas. A ficção, por ser uma área criativa e que permite mais liberdade de criação, se transformou em um dos dois focos de Moysés.
A ficção e os estudos decoloniais
Antropologia Estelar. Foi assim que o professor chamou a capacidade humana de representar a vida por meio de filmes, séries e livros em futuros incertos. Essa antropologia, nas palavras do palestrante, “envolve a superação do corpo humano, […] um projeto de nós transpormos a barreira do nosso corpo. Superarmos a nossa condição mortal”. É a antropologia do progresso. “Envolve acelerar o tempo, intensificar as coisas que vêm sendo desenvolvidas, não só no imaginário, mas também pela ciência.”
Moysés compara essa antropologia com os filmes Ex–Machina e Elysium, a série Black Mirror, e a ideia ocidental do que significa a alma. “Todos esses projetos, todas essas imagens são, de certa maneira, a finalização profana do que as religiões prometem. O que essas religiões prometem? A vida eterna, a salvação depois da morte.”
Em contraponto à ficção científica, surge a Antropologia Terrena. Ela é uma alternativa antagônica que vem dos estudos decoloniais, o segundo foco do professor. Nesse conceito, esquece-se o teor tecnológico e futurístico. “Intensifica nossa maneira de ver o planeta. […] tudo que está na terra abunda de vida. Podemos desconstruir a imagem do ser humano como algo fora da natureza. Não somos o senhor dela”, explica Moysés. No mundo que já acabou, segundo ele, a melhor maneira de aproveitar a vida é usar aquilo que já possuímos.
Contrariando a Antropologia Estelar, na Terrena, o tempo desacelera. Não há necessidade de velocidade, avanço, superação e dominação. Nas palavras do professor: “Isso pode se traduzir na ideia do bem-viver. Pode se traduzir em um estranho retorno ao passado, ao antigo”. Ele ressalta questões como dormir e comer bem, o prazer da suficiência.
Moysés trouxe como exemplo moradores da metrópole abandonando carros e usando bicicletas para a locomoção. Algumas obras que podem representar a Antropologia Terrena são o livro A queda do céu e o filme Call me by your name.