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Estudantes e representantes da causa negra compartilham aprendizados e ideias sobre inclusão racial
"Publicação do Curso de Jornalismo é voltada ao tema Vidas Negras. O lançamento ocorre no mês da Consciência Negra"
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A data de 20 de novembro marca o Dia da Consciência Negra, uma homenagem a Zumbi dos Palmares, líder quilombola brasileiro que morreu em 1695 lutando pela liberdade de seu povo. Ao longo deste semestre, alunos do curso de Jornalismo produziram uma edição do jornal Lupa, nas versões impressa e online, dedicada à temática da negritude. Foram quase quatro meses de trabalhos dos estudantes, que buscaram as melhores formas de abordar o assunto. Para explicar como foi essa experiência, o aluno Paulo Albano, que ajudou a produzir a publicação, fez uma parceria com o Mescla e escreveu o texto a seguir:  

Vidas Negras

Com o objetivo de ampliar o diálogo sobre a representatividade racial e proporcionar a troca de experiências entre públicos que vivem realidades distintas, alunos e professores do curso de Jornalismo da Unisinos realizaram na segunda-feira (11/11) uma roda de conversa com participantes de movimentos sociais ligados à causa negra. O encontro, promovido pela turma da disciplina de Jornalismo Impresso e Reportagem do campus Porto Alegre, faz parte do lançamento da 13ª edição do jornal Lupa (Leia Unisinos Porto Alegre). A publicação, lançada no mês de novembro, tem o tema “vidas negras” como foco das reportagens.

Ao abrir as discussões, a coordenadora do curso, Débora Gadret, frisou: “O jornalismo está inserido no campo das Ciências Sociais, e que, sendo assim, debater pautas como a representatividade racial no ambiente acadêmico é não apenas uma obrigação de professores e alunos, mas também uma necessidade”. Para a professora Taís Seibt, responsável pela atividade que produz o Lupa, iniciativas como essa “são uma forma de não deixar o jornal cair no esquecimento e criar algum legado dentro da universidade sobre a abordagem das questões raciais”. Taís, que acumula a função de repórter com a de professora, ainda revelou que em sua trajetória jornalística nunca havia se sentido tão provocada a pensar e se questionar sobre o assunto como durante a produção do Lupa “vidas negras”.

O grupo de dança Corpo Negra, fonte de uma reportagem
do
Lupa, ilustrou também a capa do jornal
(Foto: Fernanda Ferreira) 

A socióloga Carolina Montiel, que atualmente trabalha com saúde reprodutiva feminina, ressaltou a importância da sociedade e a imprensa fornecerem espaço para temas raciais durante todo o ano, e não apenas em novembro, época em que o assunto naturalmente ganha mais visibilidade. Carolina, que participou da reportagem sobre as altas taxas de AIDS em mulheres negras, observou que o Lupa “conseguiu fugir do óbvio com reportagens variadas” e mencionou aos estudantes a infinidade de histórias existentes na capital gaúcha e região metropolitana que estão à espera de alguém para contá-las.

Durante a produção do Lupa, uma das principais dúvidas dos estudantes foi a legitimidade e a maneira de abordar questões raciais sendo uma pessoa branca. Na visão dos convidados, todos os jornalistas devem falar sobre representatividade independentemente de sua cor. “’Vidas negras’ é sim um tema que deve ser falado por brancos”, afirmou Carol. Ela apontou que os profissionais da imprensa não necessariamente dominam todos os assuntos nos quais trabalham no dia a dia, e que nem por isso deixam de abordá-los. 

A mesma opinião tem Marcelo Fróes, um dos criadores do Núcleo de Estudantes Afro para Representar e Acolher (Neara). “Quando o branco silencia sobre o racismo, ele está contribuindo para perpetuar o preconceito”, salientou o estudante, que também participa do MilTons – coletivo que já teve um especial no Mescla. Outra ação que Marcelo desenvolve é a oficina de programação AfroPhyton – voltado à inclusão digital –, sendo Phyton uma linguagem de programação.  

Para Vitória Nascimento, estudante de Arquitetura e Urbanismo e uma das primeiras participantes do Neara, a importância do grupo na universidade é representada pelo fim da sensação de solidão em um lugar com predominância de pessoas brancas até a aceitação de suas próprias características físicas.

Por Paulo Albano 

Sobre o Lupa

O jornal Lupa nasceu como uma forma de anunciar a chegada do curso de Jornalismo na Unisinos Porto Alegre, e o nome foi uma sugestão do aluno Luís Felipe Matos. Lupa é um instrumento óptico para ampliar imagens, mas a palavra remete também ao detalhamento, ao cuidado com que o jornalismo deve olhar para seus temas. Na verdade, trata-se de um acrônimo, ou seja, uma palavra formada pelas iniciais de outras palavras. Lupa pode ser também Leia Unisinos Porto Alegre. 

Na sua primeira edição, o Lupa falou sobre a Cidade Baixa, um dos bairros mais efervescentes da capital. Ao longo das primeiras 12 edições, foram contadas as mais diversas histórias, algumas ocultas aos olhos dos moradores de Porto Alegre, como as de abandono, de aprisionamento, de pecados, de ruas e avenidas, e também de notícias boas. A 13ª edição marca a primeira vez que o tema “vidas negras” é abordado. Denilson dos Santos Flores, o único aluno negro da turma, comentou sobre a sua expectativa para as próximas edições: 

“Espero que as próximas edições do Lupa tragam assuntos tão importantes como este, da negritude, que possam provocar efeitos positivos tanto dentro da academia quanto fora. A aceitação do nosso jornal está sendo muito grande. Digo “nosso” porque tenho um sentimento de orgulho daquilo que fizemos. Espero que não fique apenas no papel, e que todos vejamos atitudes concretas da universidade. Espero também que alguns dos nossos personagens retornem à um próximo número do Lupa para vermos o que mudou em suas vidas desde o nosso jornal” – Denilson dos Santos Flores

Alunos discutiram sobre privilégios e a importância
de não pautar os negros apenas pela dor

(Foto: Fernanda Ferreira)
O debate também trouxe críticas, como o fato do racismo
ser abordado só no mês da consciência negra
(Foto: Fernanda Ferreira)
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